quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

ARGENTINA CELEBRA 25 ANOS DE DEMOCRACIA "MAIS POBRE E DESIGUAL"

Ansalatina
Por GUSTAVO MASSIMINO BUENOS AIRES, 6 DEZ (ANSA) - A herança pesada da ditadura militar [1976-1983], a hiperinflação e o maior default da história empobreceram os argentinos nos últimos 25 anos, com uma recuperação nos últimos cinco anos, que não atenuou as desigualdades sociais. Em 1983, ano da recuperação da democracia, 10% dos argentinos mais ricos do país recebiam 12 vezes a mais do que os 10% mais pobres, enquanto a relação atual é de 28 a mais com máximos de 32, após a explosão da crise de 2001-2002, a mais dura da história do país, ocasionada pelos anos de política neoliberal dos anos 90.
Na década de 80, a herança da cultura especulativa financeira da ditadura -- que quadruplicou a dívida externa e fez do dólar a moeda que define os demais preços da economia -- condicionou o primeiro governo democrático pós-ditadura, liderado pelo radical Raúl Alfonsín.
A isso se somaram as altas taxas nos Estados Unidos -- com Paul Voulker na presidência do Federal Reserve (Banco Central norte-americano) e que atualmente é assessor do presidente eleito Barack Obama --, tornando a dívida externa argentina mais pesada.
A persistência do déficit fiscal e a falta de reservas internas, ou seja, a fuga de divisas, possibilitaram o crescimento dos passivos. A crise de 1989 trouxe ao país a primeira hiperinflação do século e o começo do colapso do "austral", moeda criada em 1985 para suprir o frágil "peso argentino".
Em 1989, o peronismo voltou ao poder e recebeu um país com 7% de desempregados. Mas o improviso substantivo do governo de Carlos Menem (1989-99) levou a inflação de 4.923% a 1.343% ao ano e à primeira confiscação de depósitos [cerda de US$ 3 bilhões], sob o denominado "Plano Bonex".
Menem, diante da alta dos preços de janeiro de 1991, produto de uma desvalorização de quase 100%, convocou o economista Domingo Cavallo -- ex-funcionário do regime ditatorial -- para lançar em abril desse ano o plano de "convertibilidade", que substituiu o austral pelo peso e fixou por lei uma paridade de 1-1 com o dólar.
Se Menem tinha encontrado uma dívida externa que havia dobrado durante o mandato de Alfonsín, a US$ 60 bilhões, o custo para manter a "convertibilidade" voltou a multiplicá-la por dois e gerou o maior processo de desindustrialização do país, com uma abertura econômica quase absoluta, incluindo o setor de serviços, celebrada em escala internacional, pelos governos das potências mundiais e órgãos multilaterais.
Para acabar com a brecha fiscal, Menem iniciou uma agressiva política de privatizações em troca da dívida, recebida em valor nominal e não de mercado, em meio a fortes suspeitas de corrupção.
A convertibilidade mantinha baixa a inflação, mas o desemprego, que em 1983 era de 3,9% e em 1997 de 16,1% causou o descontentamento que levou ao poder, em 1999, o radical Fernando de la Rúa, que garantiu o "1-1" com o retorno de Cavallo ao Ministério da Economia, após alguns ajustes econômicos.
A fuga de dividas pelo colapso eminente da convertibilidade levou Cavallo a aplicar o "corralito", que limitou a extração do dinheiro das contas bancárias. Essas medidas impopulares, incluindo a redução de 13% dos salários de servidores públicos e aposentadorias, levou a uma explosão social e à renúncia de De La Rúa em 20 de dezembro de 2001, com 20% de desempregados no país.
A queda do PIB chegou a 12% em 2002 e o desemprego a 21,5%, já no governo do peronista Eduardo Duhalde, eleito pelo Congresso, após três mandatários efêmeros, que passaram pelo governo em semanas.
Um deles, o também peronista Adolfo Rodríguez Saa, decretou o default da dívida externa, na época de US$ 170 bilhões, entre aplausos dos parlamentares.
Duhalde acabou com a convertibilidade, o que fez com que o dólar ultrapassasse a quantia de 4 pesos, em fevereiro de 2001, e confiscou os depósitos em dólares dos poupadores [cerca de US$ 70 bilhões] compensando com a entrega de 1,40 pesos por cada dólar depositado no sistema.
A desvalorização, que depois se estabilizou em 3 pesos por dólar, reativou a economia, estimulou as exportações, mas gerou uma inflação de 40,9% em 2002 e uma forte redução do poder aquisitivo da população.
Duhalde convocou antecipadamente as eleições, às quais venceu em 2003 o correligionário Néstor Kirchner, que preferiu manter o dólar a 3 pesos e atenuar a inflação com controle dos preços. Em 2005, Kirchner levou adiante a maior troca de dívida externa já feita por um país, de US$ 81 bilhões, aceita por 76% dos detentores de bonos argentinos [títulos públicos], e cancelou a dívida do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A partir de 2003, a Argentina registrou altas taxas de crescimento [8% anualmente em média], mas também registrou uma grande inflação, marcada por uma grande desigualdade social. A atualidade mostra um país com menor número de desempregados [segundo índices oficiais em 7,8%] e profunda concentração de ingressos.
A pobreza, que a ditadura deixou em 35% da população em 2003 e chegou a 55% em 2002, atualmente é de 20,6%, embora estimativas privadas a situem em 30%, quase um ano após a posse de Cristina Kirchner. O desafio de conter a inflação, recompor a classe média e "reindustrializar" o país enfrenta agora a crise global.
(ANSA) 06/12/2008 16:13

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