domingo, 16 de novembro de 2008

OAB cobra julgamento de ação sobre crimes de tortura

sábado, 15 de novembro de 2008, 20:47 Online
O pedido consta da Carta de Natal, lida no encerramento da 20ª Conferência Nacional dos Advogados, em Natal
Redação
SÃO PAULO - A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) cobrou do Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento da ação na qual o Conselho Federal do órgão requer a definição se os crimes de tortura cometidos durante a ditadura militar podem ser abrangidos pela Lei da Anistia. O pedido consta da Carta de Natal, lida pelo ex-presidente nacional da OAB e membro honorário vitalício, Hermann Assis Baeta, no encerramento da 20ª Conferência Nacional dos Advogados, em Natal, no Rio Grande do Norte.

O último dia da conferência ficou marcado pela concessão de anistia ao ex-presidente João Goulart, por perseguição política, e à sua mulher, Maria Teresa Goulart. Na Carta, a OAB defende ainda mais empenho do Executivo na reabertura dos arquivos da ditadura. O texto contém as principais conclusões dos cinco dias da conferência. Seus autores são os presidentes das seccionais da OAB Rio de Janeiro, Wadih Damous, e de Goiás, Miguel Ângelo Cançado, e os conselheiros federais da entidade Frederico Coelho de Souza (Pará) e Romeu Felipe Bacellar Filho (Paraná).

Leia a íntegra da Carta de Natal:

No momento em que três datas históricas expressivas são celebradas pela sociedade brasileira - os 20 anos da promulgação da Constituição Federal, os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o cinqüentenário da Conferência Nacional dos Advogados -, a advocacia brasileira reuniu-se em Natal, Rio Grande do Norte, para debater temas que reafirmam a necessidade inadiável de efetivar as normas constitucionais, sob a ótica dos direitos e garantias fundamentais do indivíduo.

Mais de cinco mil advogados, estudantes de Direito e cidadãos assim se manifestaram nos diversos painéis da XX Conferência Nacional dos Advogados, marcada por forte sentimento democrático e de defesa intransigente dos direitos humanos.

Atenta ao período que vive o país, a Ordem dos Advogados do Brasil, por sua instância máxima de deliberação, reitera seu papel de tribuna da sociedade civil brasileira, proclamando a necessidade de insistir com obstinação na busca de justiça social.

Sem ela, não há liberdade, bem supremo que deve ser protegido pelo Estado.

Sem ela, o Estado democrático de Direito constitui mera abstração jurídica.

Os pilares em que se sustenta um país justo são construídos com sua efetiva constitucionalização, realçando o direito à vida, a dignidade do ser humano, a cidadania, a acessibilidade, a soberania nacional, os valores sociais do trabalho, o meio ambiente - equilibrado e sustentável -, a previdência social, o acesso livre a bens e serviços públicos e à informação.

A desfiguração da Constituição por desmedido número de emendas casuísticas, muitas prejudiciais aos interesses do povo brasileiro, coloca em risco a higidez do Estado, pois gera insegurança jurídica, merecendo alerta máximo da advocacia.

Essa urgente necessidade de constitucionalização do Brasil recoloca em cena o clamor da sociedade pelas reformas tributária e política, concretizando nesta última, entre tantos outros, o ideal constitucional de ampla e efetiva participação da sociedade na condução de seu destino, estabelecendo novo padrão de relacionamento Cidadão/Estado. Padrão efetivamente democrático.

Descumprir a Constituição, jamais. Afrontá-la, nunca. A Constituição Federal de 1988 rompeu a lógica do estado policial. É inadmissível, portanto que, passados 20 anos, profane-se sua essência, sob pena de vê-la rasgada, contrariando a vontade popular.

Nesse sentido, é imperativo que o Supremo Tribunal Federal se manifeste em relação à Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental, em que o Conselho Federal da OAB pede que defina se os crimes de tortura, praticados ao tempo da ditadura militar, sendo comuns e de lesa-humanidade, podem ser abrangidos pela Lei da Anistia.

Da mesma forma, no empenho de que o país se reencontre com sua história, pede a reabertura dos arquivos da ditadura, reiterando que anistia não é amnésia, e somente conhecendo os erros de seu passado um país terá meios de não os repetir.

O Estado deve conduzir suas ações dentro dos limites dos direitos e garantias fundamentais do indivíduo, com rigorosa observância aos princípios a ele inerentes. Em especial, a amplitude do direito de defesa, sustentado na presunção de inocência e no contraditório, corolários do devido processo legal, observando-se o papel e as prerrogativas do advogado na administração da justiça, considerado indispensável pelo artigo 133 da Carta Magna.

A atuação sempre firme da advocacia brasileira e de sua entidade de classe - a Ordem dos Advogados do Brasil -, permeia todas essas questões e se fortalece com os desafios cotidianos que a presente conjuntura de crise internacional impõe ao país: de necessidade de aperfeiçoamento da cultura e do ensino jurídico; de manutenção do exame de ordem; de permanente combate à corrupção e de constante fortalecimento da missão constitucional reservada ao Judiciário, sem o qual não há como falar em Estado democrático de Direito.

Todas essas demandas resumem-se numa única palavra de ordem: constitucionalizar o Brasil. Dar conteúdo efetivo aos fundamentos que a Constituição estabeleceu há duas décadas, inaugurando uma era de cidadania e liberdade, que ainda clama por realizar-se.

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