sábado, 8 de novembro de 2008

Tarso defende que AGU reveja interpretação que perdoa crimes de tortura anteriores à Lei da Anistia

4/11/2008 Fonte: O Globo

O ministro da Justiça, Tarso Genro, defendeu nesta segunda-feira que a Advocacia Geral da União (AGU) reveja o parecer que desconsiderou como crime a tortura praticada por militares na época da ditadura (1964-85). Na interpretação da AGU, crimes de tortura foram perdoados pela Lei da Anistia, de 1979, anterior à Constituição atual, que é de 1988.
A interpretação está na defesa apresentada pela AGU em ação do Ministério Público contra o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, acusado de ser um dos principais torturadores da fase final da ditadura.
- Se a defesa é técnica, ela pode ser corrigida, mas essa correção deverá ser feita de uma maneira técnica também, adequada e negociada entre a AGU e a secretaria de Direitos Humanos - disse Tarso a jornalistas.
O ministro evitou dar detalhes sobre o assunto. Tarso esteve no Palácio do Planalto p ara discutir, com o ministro das Relações Institucionais, José Múcio, e a deputada federal Luiza Erundina (PSB) a proposta de reforma política.
Segundo reportagem do GLOBO o advogado-geral da União, José Antônio Toffoli, em conversas reservadas, admitiu que vez que pode mudar trechos da defesa. Nesta segunda-feira, após audiência do prefeito reeleito de São Paulo, Gilberto Kassab , o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu Toffoli, que saiu sem dar declarações. Toffoli seguiu para Maceió.
Tarso e o ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, têm se posicionado publicamente contra o parecer. O mesmo fez a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, militante ativa contra a ditadura militar, período no qual ficou três anos presa e foi torturada, declarou que considera o crime de tortura imprescritível.
Já o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o próprio Toffoli entendem que a Lei de Anistia, de 1979, aboliu os torturadores de responderem por suas práticas. Nesta segunda, ele disse que o parecer da AGU é irrelevante, já que o STF terá que julgar antes uma ação ajuizada pelo Conselho Federal da OAB. Perguntado sobre a ameaça de Vannuchi deixar o governo caso a AGU não reveja o parecer, Jobim respondeu: -
O assunto é de competência da AGU. A revisão ou não do parecer é irrelevante. Relevante é a posição que terá que ser tomada pelo Poder Judiciário, e essa decisão não está no bojo desta ação (do MPF contra Ustra e Maciel), e sim da ação ajuizada pelo Conselho Federal da OAB. Defensor da anistia a torturadores, Jobim, que chefia as Forças Armadas, ainda comentou:
- O que vai ser decidido pelo Supremo não é se alguém é a favor ou contra torturados ou torturadores. A questão é saber se o grande acordo político da transição na década de 70, que deu origem à anistia, deve ser revisto interpretativamente ou não.
O presidente Lula, por sua vez, não quer que essa discussão seja pública. Em Havana, semana passada, o presidente disse que convocaria a AGU e a Secretaria Especial de Direitos Humanos para um entendimento sobre a Lei da Anistia que evitasse desavenças públicas que comprometeriam a imagem do Brasil no exterior.
Gilmar Mendes pede cautela: Direitos humanos valem para todos
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, pediu nesta segunda-feira cautela na discussão sobre a prescrição dos crimes de tortura, cometidos durante o regime militar. Ao responder sobre a declaração da ministra Dilma, o ministro afirmou que o tema referente aos direitos humanos se presta a ideologizações e politizações e, por isso, trata-se de uma questão de "dupla face".
- Porque o texto constitucional diz que o crime de terrorismo também é imprescritível - disse ele, durante um debate sobre democracia e estado de Direito, em seminário organizado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas e Instituto Fernando Henrique Cardoso. - Eu repudio qualquer manipulação ou tentativa de tratar unilateralmente os casos de direitos humanos. Direitos humanos valem para todos: presos, presidiários, ativistas políticos. Não é possível dar prioridade para determinadas pessoas que tenham determinada atuação política. Direitos humanos não pode ser ideologizado - completou ele.
Gilmar Mendes também se manifestou sobre o documento da AGU.
-Eu não conheço todos os dados postos (pela AGU). Mas é claro que não é dado ao advogado geral da União fazer escolhas quando imputam responsabilidade nas ações à própria União. Tem que fazer a defesa do ato, a não ser que seja evidente a responsabilidade da União ou a responsabilidade de quem é acusado. Embora considere legítimo o protesto de diferentes categorias, ele disse que o país precisaria "evoluir para um padrão civilizatório". Eros Grau pede informações a Executivo e Legislativo
Também nesta segunda, o ministro Eros Grau, do STF, determinou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Congresso, Garibaldi Alves Filho, prestem informações sobre a punição para as autoridades militares que torturaram e mataram presos políticos durante a ditadura (1964-1985).
Ouvir a autoridade responsável pelo ato questionado em até cinco dias - no caso a Presidência da República e o Congresso Nacional, é o procedimento habitual, previsto na legislação, nos processos que tramitam na Corte. Na seqüência, o processo deve seguir para a Procuradoria Geral da República, que tem o mesmo prazo de cinco dias para emitir parecer, como é usual, também, nas ações que chegam ao STF.
A decisão do ministro se refere ao julgamento da ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que pede que a Corte declare que os crimes praticados por militares e policiais durante a ditadura não têm a cobertura da Lei de Anistia. A entidade sustenta que os torturadores não estão protegidos pela anistia e devem responder pelos crimes que cometeram.

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