sexta-feira, 7 de novembro de 2008

DOPS não escapará do juiz espanhol Garzon

31/8/2008 19:48:03 http://www.correiodobrasil.com.br:80/noticia.asp?c=142896

Por Rui Martins - de Berna
Dizem as Escrituras que nada ficará todo tempo encoberto e que mais ou menos dias, tudo virá a ser público. O segredo, a impunidade, a manipulação geralmente têm um dia em que acabam e são descobertos.
Em 2001, num bate-boca no Senado, o senador Jader Barbalho, teve a seguinte explosão verbal com o também senador Romeu Tuma:

– Não sei quem irá nos julgar: Deus ou o diabo. E vossa Excelência vai ter que prestar conta lá pelo presente ou pelo passado. E pode estar perto. A palidez de vossa excelência está indicando que é em breve isso.
Essa frase agourenta e profética ficou registrada no jornal paulista Folha de São Paulo, pois Romeu Tuma, é senador por São Paulo. E, enfim, se realizou, mas não caberá ainda a Deus ou o Diabo julgar Romeu Tuma, porém um homem mais rigoroso que o inspetor Javert dos Miseráveis, de Vitor Hugo, o juiz Balthazar Garzon.
Garzon, o juiz sombra que acabou com a velhice tranquila de um criminoso, o general Augusto Pinochet. Garzon é pior que Deus, porque não tem misericórdia, e que o diabo, porque aplica aqui na vida terrena do condenado a pena do inferno. Não precisam as almas dos mortos, assassinados depois de torturados, virem fazer assombração junto aos que viveram tranqüilos, como bons pais e avós de famílias, depois de tantos crimes cometidos sob sua responsabilidade.
Não, Garzon, não deixa a punição para Deus ou o diabo, que afinal podem não existir. Ele quer o castigo nesta nossa terrinha, aquele castigo que consiste em destruir a hipocrisia de uma vida respeitável. Nem todos os assassinos terminam atrás da grades, já velhos ou doentes, podem mesmo se beneficiar de uma tolerância, que não tiveram com suas vítimas.
O supremo castigo é o opróbio, palavra complicada que significa a vergonha a que se submete o bandido diante do povo, depois de revelado seu crime. É uma espécie de pelourinho virtual. Uma vergonha seguida de rejeição. É o Inferno ardente, no qual o juiz Garzon costuma jogar seus condenados.
Antes de Garzon, Pinochet era citado como ditador chileno nas enciclopédias; depois de Garzon, Pinochet entra para a História como ditador assassino. O castigo que não vem a cavalo é pior que uma pena de morte.
Filinto Mueler, por exemplo, mão pesada da ditadura de Vargas, era o como o Fleury do DOPS durante a ditadura militar brasileira. Acabou conhecido pela nova geração como o autor indireto do assassinato de Olga, a mulher de Prestes. Escapou de qualquer castigo humano, ficou para Deus ou o Diabo decidirem, mesmo se morreu carbonizado no único acidente da Varig na rota Paris, em chamas ao aterrissar.
Eu daria o premio Petrobrás (nunca fui muito com a Esso Standard Oil) de reportagem aos jornalistas da Folha que descobriram a família do espanhol Miguel Sabat Nuet, assassinado no Dops, em outubro de 1973. E 35 anos depois ressurgem os ossos e o fantasma de uma das tantas vítimas da repressão brasileira.
Está na hora de se ler o livro do jornalista Percival de Souza, Autópsia do Medo, meu colega na Major Quedinho, no Estadão e JT, antes de minha partida para o exílio. Percival compara Tuma a Fleury. E meu professor de Direito na UPS, Gofredo da Silva Telles, falou assim para a Folha, em outubro de 2000:
Romeu Tuma assinava documentos comprometedores. Os papeis avalizariam versões policiais de que presos mortos sob tortura haviam de suicidado.
O espanhol Miguel Sabat Nuet praticamente ressuscitou da vala no cemitério Perus, onde tinha sido lançado entre indigentes e outras vítimas da ditadura, para pedir Justiça. E, sem dúvida, Garzon e a Espanha farão a justiça, esperada há tanto tempo por tantos perseguidos, confirmando a praga lançada por Jader Barbalho, no Senado há 7 anos.

Um comentário:

Luiz Brasileiro disse...

Ótimo o artigo de Rui Martins.Não tenho dúvidas que se os criminosos que deram sustentação à ditadura perseguindo, prendendo, torturando e matando forem julgados, Romeu Tuma estará entre eles.

Os fatos mais conhecidos narrados por ex presos políticos e no livro de Percival de Souza, AUTÓPSIA DO MEDO, não deixam dúvidas: se ele não torturou nem matou foi partícipe, expressão que em direito penal quer dizer que alguém colaborou para o cometimento de um crime, mesmo sem ter o domínio do fato e sem ter participado diretamente dos atos executórios.

Um torturador conhecido, Brilhante Ustra, já declinou em sua defesa na ação retroativa movida contra si pela União, que Tuma sabia e presenciou tudo que ocorria no DOPS e na OBAN, bem como nomeou o facínora como testemunha. Só isto é suficiente para Tuma ir a julgamento; quem conhece direito penal sabe disto.

Depois de ler a petição inicial da ADPF 153 que tramita no STF não tenho dúvidas que a lei de anistia de 1979 não abrange a anistia de torturadores, pois tortura não é crime político, entre outras coisas, bem como os criminosos, esbirros da ditadura serão julgados, pois não houve prescrição dos crimes.

Este entendimento, de que inexiste prescrição das ações que visem punir os criminosos homicidas, pistoleiros da ditadura, pauta-se em entendimento análogo esposado pelo STJ em ações cíveis.

A pior escória será julgada e encarcerada em breve, aqueles que ainda estiverem vivos serão recolhidos ao cácere em prisão de segurança máxima, junto com Fernandinho Beira-Mar.