sábado, 8 de novembro de 2008

Tortura não era prevista nem nas leis da ditadura'


O jurista e professor emérito da Universidade de São Paulo (USP) Dalmo Dallari não tem dúvidas de que o crime de tortura - inafiançável e não sujeito a anistia, segundo todos os tratados internacionais assinados pelo Brasil - não está coberto pela Lei de Anistia aprovada em 1979. “É absurdo classificar a tortura como crime político, quando é uma aberração do sistema, que não está prevista nem nas leis da ditadura”, afirmou. Dallari lembra que defende a aplicação da lei também contra guerrilheiros que tenham torturado inimigos.

A entrevista é de Moacir Assunção e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 04-11-2008.

Eis a entrevista.

Por que, na visão do senhor, a tortura não está coberta pela Lei de Anistia, como sugerem o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e a Advocacia-Geral da União (AGU)?

Há razões objetivas, jurídicas para discordar desta visão, excessivamente formalista, típica de burocratas jurídicos. Nenhum objetivo político inclui a tortura como prática. A tortura de presos políticos era praticada por pessoas degeneradas, que se aproveitavam do posto que ocupavam para praticar este crime. As próprias leis da ditadura jamais colocaram a tortura de prisioneiros como objeto da ação do regime.

Então, está incorreta a visão segundo a qual a Lei de Anistia perdoou todos os que participaram de conflitos armados na ditadura?

Na jurisprudência nacional e internacional trata-se de crime contra a humanidade não afiançável e não passível de anistia. Se em algum país perdoa-se torturadores, a interpretação é de que estaria ocorrendo auto-anistia, que não teria nenhum valor jurídico. Os próprios torturadores não podem se perdoar, o que seria um absurdo.

Como será a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), provocado por pedido de explicações do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre este tema?

Não tenho dúvida de que o STF vai julgar por critérios jurídicos e não políticos. Assim, dirá que a tortura não é passível de anistia. Se houver dúvida, basta observar a Constituição Federal que veta qualquer forma de tratamento degradante a prisioneiros, inclusive a tortura.

Qual a conseqüência que uma decisão neste sentido trará à imagem do Brasil?

Será muito bom. Tenho visitado países latino-americanos e sou cobrado por colegas. “Até quando vocês vão perdoar os torturadores ?” é o que mais ouço.

Nenhum comentário: